domingo, 25 de dezembro de 2011

O QUE HÁ DE MODERNO NA FILA - Para Davi Oliveira e Adriano Oliveira

Diz-se que moderno para os dias de hoje é encontrar uma forma mais tranqüila para se viver. Revistas para ensinar-nos como fazer, proliferam: Bons Fluidos, Vida Simples, Viver Bem e Cia. Do caos, algo assim “pós-moderno”, nasce uma onda “zen” com ares de verdadeiramente moderna!

Parece que moderno é aquietar a mente, esticar a espinha e tranqüilizar o coração. Tudo isto e mais cuidar bem do corpo. Que coisa! Há alguns anos atrás, já não era tudo assim? Era! As mentes brilhavam em meio a recursos escassos, porque tinham tempo para simplesmente pensar. Tinham tempo para aquietar-se. Éramos mais magros, mais leves e mais dignos. Carregávamos as nossas dores e sabores com mais elegância sobre espinha devidamente reta. E como o amor era mais presente ou mais manifesto em flores, cartões, canções e salamaleques, dormíamos e vivíamos com coração tranqüilo.

Num passado verdadeiramente moderno, tínhamos um senso muito rigoroso de dever e o cumpríamos, o que talvez nos garantisse consciência mais tranqüila. E por falar em dever logo assim depois das eleições, o voto é o dever mais direito e direto do momento e seja um, ou seja outro – pior: sendo os dois – mais de 300 mil soteropolitanos ou afins abriram mão dele. Calaram-se! Perderam dever e direito.

Os que não votaram deixaram de cumprir o dever de se comprometer com o destino da sua cidade. Perderam o direito à festa democrática, da qual todos podem participar, mantidas as exigências mínimas da lei. Perderam uma festa que não conhece preconceito de raça, credo, condição social, econômica, partidária ou opção sexual. Todos juntos iguais. Os que não votaram perderam o show de tecnologia que a cada pleito eleitoral todo o Estado e Nação brasileiros dão: vota-se em menos de um minuto seja lá para quantos cargos for.

Ah, mas o show tecnológico, no entanto, tão “pós-moderno” nos tirou de um passado, que de tão moderno – segundo conceito de hoje – era revolucionário. Revolucionava a nossa solidão, o nosso “insulamento”: o voto em papel nos impunha a fila, a demora, o tempo. E nos deixava em contato com o outro. Dava-nos a oportunidade de estar com o outro... O outro brasileiro votando no presidente, o outro soteropolitano votando no prefeito.

O voto em papel lá do passado – nem tão remoto – nos tomava tempo, mas devolvia-nos o tempo de discutir nossas escolhas com o vizinho de fila, de conhecer o vizinho de fila, de paquerar uma menina ou aquele cara que encontrávamos todos os anos na mesma sala mal cuidada de uma escola pública de nossa zona eleitoral!

Ali na fila se atualizavam as notícias. “Aninha filha de Filó pariu! Não soube? O neném se chama Joaquim e já tem seis meses”; “Marta, finalmente, formou! Foi um festão!”; “D. Cota descansou. A missa de ano é mês que vem”; “Menina! Anota aí o meu celular novo.”. Bem ali na fila, casamentos, separações, nascimentos, falecimentos, formaturas, batizados, prisões, bofetões e “bafafás”, tudo era passado a limpo, discutido e bem explicado.

Aquela fila nos dava tempo, nos deixava em exposição uns diante dos outros e assim éramos mais humanos e verdadeiramente modernos. A fila nos dava tempo e o tempo sempre nos dá humanidade.

O show tecnológico nos tirou de um passado de fraude e corrupção eleitorais. Isto também é verdade! E é para lá de moderno! Então louvemos todas as faces do que se pode chamar, verdadeiramente, moderno: as do futuro e as do passado!

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